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Saúde Social: a parte da vida que estamos esquecendo de cuidar

10 de abril de 2025 por Andréa Nery

“Você já parou para pensar que sua rede de amigos pode ser tão importante quanto seu colesterol?”

Essa pergunta me pegou de surpresa em um evento de download do SXSW[i] que trouxe o tema da Saúde Social. Era uma sala cheia de pessoas atentas, mas bastou essa frase para provocar um burburinho seguido de um silêncio reflexivo, daqueles que dizem mais que palavras. Eu também fui atravessada por ela.

Vivemos um tempo em que as transformações são intensas — no trabalho, na forma como nos comunicamos, nos deslocamos, consumimos, aprendemos. Mas raramente paramos para refletir sobre o impacto que essas mudanças têm em nossa saúde integral — corpo, mente, emoções e, sobretudo, nas nossas conexões humanas.

Quero compartilhar uma história pessoal para te convidar a essa reflexão.

Meu pai está completando 82 anos este mês. E está animado organizando mais uma viagem para reencontrar seus amigos de longa data. Quem o conhece sabe que ele nunca foi o mais sociável da turma — não é o tipo que anima uma festa ou participa de grupos comunitários. Na verdade, há algum tempo, escolheu viver na praia, longe do burburinho dos grandes centros. Mas sempre teve ao seu lado um grupo pequeno e fiel de amigos. Com eles, compartilha conversas, memórias, conselhos e silêncios. Com eles, troca vida.

Hoje, vejo com mais clareza o quanto essas relações mantêm meu pai vivo — no corpo e no espírito. É essa vitalidade que me inspira a cuidar também das minhas conexões.

Ao longo da vida, cultivei amizades que caminharam comigo por diferentes fases. Relações que me nutriram com riso, escuta e afeto. Mas confesso que tenho sentido uma mudança nos últimos anos. Por um lado, os grupos de mensagens nos aproximam. Por outro, tornaram normal a ideia de que não precisamos mais nos ver com frequência. E, com isso, a qualidade da nossa presença foi se esvaziando.

As agendas estão cheias, as “obrigações” ganham prioridade. Uma ligação virou um áudio de 30 segundos com emojis. Aqueles encontros longos e deliciosos foram substituídos por mensagens rápidas, em que a gente reforça a saudade, mas quase nunca a mata.

Nas redes sociais, “vemos” nossos amigos vivendo suas conquistas — viagens, promoções, formaturas — e temos a ilusão de que estamos por perto. Mas presença não se mede por curtidas.

Talvez por isso eu tenha buscado mais encontros presenciais. E percebo que não estou sozinha. Há uma sede de conexão. Mas, curiosamente, mesmo nos eventos presenciais, muitos seguem mais preocupados em registrar o momento do que em vivê-lo. Os celulares nos mantêm ocupados com a rede, mas distantes da relação. A conexão é adiada para depois.

E aí eu penso: não é de se admirar que estejamos tão cansados dos encontros online. A praticidade de estar em casa tem um custo. Em lugares onde o deslocamento é difícil, sim, o digital nos poupa tempo — mas também nos rouba o calor do encontro. Podemos assistir a aulas, fazer reuniões, ir ao médico e ao terapeuta… mas dificilmente conseguimos, à distância, vivenciar aquele tipo de conexão que nos dá pertencimento, afeto e sentido.

A saúde social está adoecendo.

É por isso que venho insistindo (em mim e nos outros) sobre a importância da intencionalidade. Sem ela, corremos o risco de seguir juntos — mas sozinhos.

Precisamos cuidar das nossas relações com o mesmo compromisso com que cuidamos do corpo. Relações também adoecem por falta de presença, por excesso de superficialidade.

Voltando ao meu pai: seus encontros não são fáceis de acontecer. Ele e seus amigos enfrentam dores no corpo, imprevistos de saúde, dificuldade de locomoção. Mas continuam se mobilizando, com afeto e dedicação, para que esses momentos existam. Tornaram-se mais flexíveis, mais atentos, mais generosos uns com os outros.

E quando vejo as fotos desses encontros — cheias de sorrisos, memórias, gargalhadas, despedidas — eu entendo: ali há uma fonte de energia vital, que estamos esquecendo de acessar. Uma energia que se torna ainda mais essencial num mundo onde a tecnologia nos oferece mais anos de vida.

Mas… que vida é essa que vamos viver, se não cuidarmos de nossas relações com o mesmo zelo com que cuidamos do colesterol?


[i] O South by Southwest (SXSW) é um festival e conferência anual que acontece em Austin, no Texas, desde 1987. É um dos maiores e mais influentes eventos do mundo sobre inovação, tecnologia, música e cinema. 


[i] Originalmente publicado no Blog Lentes de Decisão do Estadão Digital em 10/04/2025

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