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marés e humores

16 de junho de 2023 por Cláudia Miranda Gonçalves

Texto originalmente publicado no Blog Lentes de Decisão, Estadão Digital, Economia & Negócios, em 16/06/23

https://www.estadao.com.br/economia/lentes-de-decisao/mares-e-humores/

Estou aqui em minha visita bimestral a João Pessoa.  Próxima à natureza, tenho uma visão de 200 graus desse imenso mar verde turquesa e experimento um pouco de cura por poder ver o horizonte. Já ouvi dizer que uma pessoa deveria erguer o olhar para o horizonte por pelo menos 15 minutos por dia, pois quando elevamos nossa visão, isso nos ajuda a ver além da atividade do dia-a-dia e a perceber a beleza de nosso mundo. Para mim, olhar para o horizonte me lembra de tirar um tempo para ver o profundo visível e invisível em mim e no nosso mundo.

Quando cheguei o clima estava ensolarado e enquanto caminhava pela orla, notei o ritmo mais calmo das águas do mar. E daí veio a chuva mais constante e esperada do inverno daqui. Ver o mar e pisar na areia, perder o olhar no horizonte é a forma que encontro para me renovar e me ajudar a me refazer do trabalho e da vida excessivamente urbana de São Paulo. 

Em João Pessoa, fica mais fácil ver a natureza em seus diversos humores. Mar revirado e turvo; ventos sibilantes, sol forte e céu intensamente azul.  Humores e mudanças na natureza são percebidos e considerados normais. 

O trovão, o raio, o granizo e o vento podem trazer uma trilha sonora barulhenta para o dia, mas  quando o sol aparece no dia seguinte, aceitamos a mudança com boas-vindas, não com surpresa. Também não achamos que as alterações da natureza sejam culpa dela. Já não posso dizer o mesmo sobre nós, humanos. 

O que a Natureza pode nos ensinar sobre a mudança contínua?

Muitas vezes pensamos que deveríamos viver em um estado estável. Achamos que mudanças de humor significam que uma pessoa pode não estar “estável”. Controle e estabilidade emocional estão tão profundamente inscritos em nossa cultura que frequentemente escuto de meus clientes algo do tipo: “sim (algo deu muito errado), mas eu deveria saber me controlar; eu deveria ter feito X”. Ser toxicamente crítico consigo mesmo em situações difíceis pode levar a pensar subliminarmente que a culpa pela situação é de quem viveu a situação. É como se o leão não fosse te atacar porque você está calmo. Como se o seu medo/ nervosismo ou qualquer reação no momento de um incidente fosse a razão para um ataque do outro. 

Será que essa crença nos serve em um mundo que está em constante movimento? Se olhássemos para a natureza para ensinar-nos sobre a vida, reconheceríamos que nossas emoções e humores fazem parte da vida. Quando nos comportamos como se não tivéssemos ou não pudéssemos ter altos e baixos, quando usamos nossas mentes para ignorar nossos humores, estamos optando por perder contato com esse aspecto de nós mesmos.

Acredito que precisamos continuar a integrar todas as nossas partes (incluindo nossos humores) para que possamos nos tornar verdadeiramente completos. 

Bem, espero que tenha lhe dado algum entretenimento, algo para

pensar, e espero que tenha feito algo para libertá-lo de

pensando em termos materiais e lógicos, na sintaxe e terminologia da

mecânica, quando na verdade você está tentando pensar sobre coisas vivas.

Gregory Bateson

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