Roda de Conversa
Recentemente fiz uma formação em “Circulos de paz e transformação de conflitos”. Diferente, não?! O que levou uma consultora e coach, que trabalha com coaching de carreira e consultoria em desenvolvimento de pessoas, a buscar uma ferramenta da Justiça Restaurativa? Uma possibilidade de lidar de forma diferente com a quantidade (enorme) de conflitos nas empresas. Justiça restaurativa soou como uma busca por cura; cerzir um tecido desgastado ou roto. Me encantei.
Durante quatro dias entrei em contato com um processo delicado que me reconectou com uma das práticas coletivas humanas mais antigas: a roda! Em torno do fogo, a roda de conversa é nossa ferramenta mais antiga e primordial enquanto grupo. Na roda, somos todos iguais; nenhum ponto do círculo é melhor ou pior, nem mais nem menos. Enquanto cada ponto é diferente dentro do círculo, todos são importantes para o todo.
Uma técnica poderosa, que garante que todos sejam ouvidos; tudo seja acolhido. Em contrapartida, todos precisam ouvir; todos precisam acolher tudo. Isso é transformador! Um verdadeiro curso de escutatória.
Como funciona? O método é muito elegante: começamos fazendo check-in: como estou chegando aqui? Cada um segura o objeto da palavra ( a regra é que apenas quem está com este objeto em mãos pode falar) e se expressa; sem ser interrompido, apressado, excluído. Não tem réplica ou tréplica: não há embates – apenas o que cada um fala sobre si. Feito check in, nos conectamos com o que temos de melhor enquanto seres humanos e oferecemos um valor ou característica para aquele círculo; lembro-me que ofereci compaixão e humor :). Depois começam as perguntas norteadoras, que guiam o círculo através de algum tema. Do positivo dentro do tema, para o difícil do tema, para os acordos no final. Daí se faz o check out.
Simples, não? Sim! E é poderoso! Mas o simples não é fácil. Precisamos nos abrir; todos têm que participar igualmente – inclusive o(s) facilitador(es). O círculo nos ensina a ouvir, a deixar que o que o outro traz reverbere, nos amplia a visão. Os acordos construídos a partir dessa verdadeira democracia são muito mais fortes e sustentáveis, pois foram forjados ali, em conjunto, e cada um acolhe para si o que lhe faz sentido; e o coletivo realiza o acordo todo (lembra que cada ponto do círculo é diferente do outro e que todos fazem o círculo?).
Tá, muito lindo, mas isso não funciona no mundo corporativo! Pois bem. Duas pitadas de coragem e uma de loucura e…fiz. Apliquei a técnica em uma empresa em que dois times estavam com conflitos e baixo rendimento. Quais foram os principais resultados?
1- conseguimos um nível de transparência e sinceridade incomum no dia a dia corporativo; com isso, as pessoas deram-se conta, aliviadas, de que não estava bom para ninguém.
2- todos se ouviram; isso humanizou os vilões e vítimas; as pessoas saíram de suas versões usuais, ampliaram sua visão sobre o que estava acontecendo e sobre como cada um se sentia.
3- os times construíram sua base de relacionamento em que todos são igualmente importantes; cada um é diferente, tem direito de ser diferente, e cada um contribui do seu jeito para a construção do time – isso leva a uma maior tolerância ao diferente.
4- depois da base construída, falaram das coisas difíceis a partir de suas experiências em lugar de acusar;
5 – das conversas difíceis, veio a pergunta: o que o grupo precisa, quais os acordos para funcionarem bem? estes acordos tinham a função d contemplar a todos; em diversas dimensões; só paramos de agregar itens quando todos sentiram-se contemplados; nenhum item foi eliminado, pois tudo é importante
6- cada um escolheu quais itens do acordo queria se comprometer …
Quarenta e cinco dias depois, voltei para ouvir o seguinte feedback:
As coisas melhoraram muito, e queremos seguir com os acordos. Os problemas sobre os quais não temos alçada continuam lá, mas nós mudamos.
Precisamos buscar novas formas de fazer as coisas nas empresas! E sigo experimentando e agradecendo aos clientes corajosos que se abrem para experimentar!!!
Obrigada Sabrina Paroli e Olivia Braschi, da Ciclos pelo maravilhoso workshop e aprendizado.
Fonte: BLOG Lentes de Decisão – Estadão
Voltar